Westworld tem uma premissa aparentemente boba, mas que se revela uma poderosa fonte de drama. A série inicia em Westworld, um parque de diversões futurista que permite a seus visitantes viverem suas fantasias utilizando uma consciência artificial dos anfitriões. O seriado está atualmente na sua terceira temporada e está conseguindo expandir ainda mais os elementos de seu mundo e, portanto, suas temáticas. Se liga aí nos 5 motivos para você assistir Westworld:
“Lunch atop a Skyscraper” (New York Construction Workers Lunching on a Crossbeam) é uma das fotografias mais iconicas já tiradas e a semelhança com a foto inicial de Caleb (Aaron Paul) e seu robô companheiro de trabalho (na terceira temporada da série) não é coincidência. Tirada em cima da estrutura de aço do 30 Rockefeller Plaza, durante a construção do Rockefeller Center, em Manhattan, (Nova York), “Lunch atop a Skyscraper” faz uma conexão estética direta com as relações de trabalho e as dificuldades que o personagem de Aaron Paul. O que nos leva a compreender a atualidade dos temas trabalhados por Lisa Joy e Jonathan Nolan (criadores e showrruners da série).
O cenário futurista que ensaia um possível futuro do nosso mundo (no ano de 2058 aproximadamente) releva temas atuais como a automação e o desemprego que essa automação das forças de trabalho podem causar na nossa economia (principalmente em um país como o nosso que tem baixa qualificação), a uberização do trabalho. Isso são alguns de vários debates que são suscitados por uma única imagem, que ecoa a foto creditada a Charles C. Ebbets, em 2003.
Não são só onze homens almoçando, sentados em uma viga com os pés balançando 840 pés (260 m) acima das ruas da cidade de Nova York ou um homem com baixa remuneração que pode perder seu emprego para outro robô (por que não?) na Neo-Los Angeles de 2058, mas as relações humanas e os ciclos que se repetem não importando os aparatos e as “cascas” tecnológicas que vestimos enquanto sociedade.
Westworld assim como várias séries incríveis da HBO (Home Box Office) como The Sopranos, Game of Thrones, Veep, The wire, Succession, Big little lies, possui um valor de produção MUITO acima da média. Isso se reflete no processo inicial de roteirização, a série dá mais tempos para a sala de roteiristas trabalhar nos arcos (por isso, o espaçamento mais longo entre temporadas) e, como sabemos, tempo, acima de tudo, é dinheiro. Além disso, o figurino, direção de fotografia e de arte são impecáveis.
O tempo acima da média que comentamos anteriormente se materializa nos roteiros da séries, que às vezes são tão elaborados que precisamos para e conversar MUITO, MAIS MUITO MESMO para entender os arcos dos personagens, a temporalidades das linhas da narrativa e os muito artifícios que a série utilizado. O primeiro com o que nos deparamos, na primeira temporada, é a narrativa não linear oculta.
Em sua primeira temporada, a série parece brincar com a audiência fazendo um teste psicológico: ele utiliza seus vários núcleos para desenvolver a trama e imagem após imagem vai construindo seu mundo. A série parece usar o efeito kuleshov (a terceira imagem que construímos a partir da sucessão de duas imagens), que é a mais pura expressão da linearidade do pensamento humano, para subverter e trazer uma narrativa não linear. É como se a série fosse na perspectiva de um humano, que percebe e experimenta as ações linearmente, mas, logo depois, percebemos que essa percepção é não linear de anfitrião.
A segunda temporada extrapola isso (das linhas do tempo) e traz conceitos de simulação enquanto desenvolve muito bem as suas temáticas filosóficas. Mas isso tudo não importa se não nos importamos com os personagens, não é?! No entanto, esse não é o caso. Temos Maeve Millay (Thandie Newton), Ford (Anthony Hopkins), Bernard (Jeffrey Wright), Dolores (Evan Rachel Wood) e tantos outros que nos levam a diferentes experimentações deste mundo.
O interessante disso tudo, é que o roteiro de Westworld consegue, a partir do próprio conceito de narrativa (vida dos anfitriões) traçar paralelos com a vida humana em uma espécie de metalinguagem sobre viver e existir. Os anfitriões vivem em loops nas suas narrativas, que ocorrem quando o final da narrativa de um host (anfitrião) leva a uma reinicialização (também conhecida como redefinição).
É muito interessante a companhar a jornada desses personagens, pois, além de construir um roteiro com camadas ultra planejadas e pensadas o roteiro traz um reflexão sobre o próprio ato de escrita e contar histórias onde a backstory (história que antecede a jornada atual) de um personagem serve como o nosso passado que implica nas dificuldades e conflitos que passamos no agora. O roteiro de Westworld traz um conceito do roteiro como principio para a existência e as lógicas de viver desses personagens. É instigante e muito interessante!
Desde “Simulacros e simulações” (1981) de Jean Baudrillard e o fim do século passado, as discussões sobre simulações e “matrix” vem se intensificado e as tecnologias atuais catapultam isso ainda mais. A nosso quinto motivo para você assistir essa série incrível de Lisa Joy e Jonathan Nolan é como a série exprime visualmente tais conceitos. Por exemplo, essa cena acima é do segundo episódio da atual terceira temporada e traduz visualmente a percepção da host Maeve que está em uma simulação. A tela “natural” padrão das TVs dá lugar as pequenas barras pretas na parte superior e inferior da tela. Um efeito semelhante foi usado na segunda temporada para indicar quando os anfitriões estavam dentro do berço.
A série é um olhar crítico sobre um possível futuro que nos aguarda, sobre as relações humanas e o que nos torna humanos e se somos humanos o suficiente. O comentário social da série desvela o que uma sociedade cansada, autoritária, hierarquizada, egoísta e tecnológica (como a nossa sociedade ainda deve ser) pode ser e o que nossos produtos e criações podem se tornar (e se rebelar?!). Westworld é de uma grandiosidade estética, técnica e as suas contribuições para a narrativa episódica, a direção e design de produção merece ser apreciada, reconhecida e assistida.