Com o lançamento do primeiro trailer da nova série da Amazon – Senhor dos Anéis: Anéis do Poder, veio também aquela velha discussão repetitiva sobre a adaptação de personagens negros em obras onde a negritude não existia, e se aquilo não é ser “pouco fiel” à obra original, e até mesmo “faltar respeito” a obra original. Então, vamos conversar.
“Grandes poderes foram forjados, reinos ascenderam à glória e caíram em ruína, heróis improváveis foram testados, a esperança ficou pendurada pelo mais fino dos fios e um dos maiores vilões que já saíram da caneta de Tolkien ameaçou cobrir todo o mundo na escuridão”.
Desde sempre, quando há adaptação de personagens negros/negras em filmes, séries e demais conteúdos originais onde pretos e pretas não existiam, as fã bases correm para o ataque, criticando a falta de respeito com aqueles personagens originais. Uns dizem que “falta leitura” para os produtores que adaptaram, outros falam que “é algum tipo de lacração/inclusão forçada das minorias” em produções onde não existiam. O ódio destilado é ainda maior, quando se tratando de personagens que já são mundialmente reconhecidos por serem brancos, como foi o caso da Ariel, na (possível) adaptação de A Pequena Sereia. Assim foi com Miles Morales para Homem-Aranha, com a Riri Williams e o Homem de Ferro, e com Estelar, dos Titans.
Mas o interessante de observar é que um dos maiores argumentos, sempre que há críticas de uma adaptação, é o famoso “ah, mas são personagens que não são brancos! Porque não criam seus próprios personagens, ao invés de ficar adaptando os que já conhecemos?!” E foi isso que a série embasada no conteúdo original de R.R. Tolkien – Os Anéis do Poder – se propôs a fazer! Criar um personagem negro que também é um elfo. Original da série. Ainda assim, houve uma chuvarada de críticas e xingamentos para cima dele, e de outra personagem negra colocada na série como uma rainha anã. Se o problema é adaptar, mas também criar personagens originais, então onde está a origem desta crítica? Afinal, qual o real interesse em criticar?
Outra coisa importante a ser levada em consideração: Há personagens nos livros originais do Tolkien, como o Silmarillion, Senhor dos Anéis e O Hobbit que não necessariamente descrevem os personagens como brancos, asiáticos, negros, etc. São simplesmente personagens dentro da história, personagens que os leitores e leitoras ao redor do mundo assumiram para si como brancos, alvos como a neve, mas que em uma adaptação, não necessariamente precisam seguir aquilo que se imagina deles, afinal, esta adaptação acontece quase 100 anos depois de algumas das obras originais de Tolkien terem sido lançadas. Adaptação; palavra que significa “utilização de qualquer objeto ou utensílio para finalidade diversa de seu uso primitivo”. Então, qual o real interesse em criticar?
A resposta é simples: Preconceito. Preconceito por personagens que nem chegaram ainda a ver a luz do dia, que ainda não conhecemos, nem vimos seus diálogos e participações na série. Não sabemos se a série vai ser boa, ruim, mas já há duras críticas à raça de um personagem – cuja única mudança é da tonalidade da pele. Preconceito. É bem verdade que a série da Amazon apropria-se do momento de nosso mundo atual, onde pessoas pretas consomem bem mais conteúdo POP, e já são vistos como público consumidor, logo, é lucrativo para a empresa que haja personagens negros no “daqui pra frente” das produções ao redor do mundo.
Afinal, não podemos esquecer que para o capital, tudo gira em torno do que vende. E a verdade é que negritude está em alta no mundo do consumo. Não sabemos se Rings of Power vai ser realmente tudo o que promete ser. Nem sabemos em quê vai influenciar a negritude do elfo negro Arondir (Ismael Cruz Córdova), ou de Disa – A princesa Anã (Sophia Nomvete). Mas sabemos que as duras críticas oferecidas a ambos, parte de um lugar muito mais escuro que Mordor, e bem mais maligno que Saruman, ou Sauron.
É foda que esse tipo de discussão ainda precise existir. Tda vez q lança é isso