Finalmente tive a oportunidade de ler Roses N’ Guns, a mais recente HQ do Gabriel Arrais (Necromorfus, Noite de Spoiler) e posso dizer sem sombra de dúvidas: Roses N’ Guns é tudo o que eu não esperava! Um gibi eletrizante do início ao fim. Roses N’ Guns – Entre becos, vidas e Rosas.
Roses N’ Guns é uma história “completinha” do autor Gabriel Arrais (Necromorfus, Savants of Sound) com arte de Thiago Ossostortos (Mamonas Assassinas – A Graphic Novel Oficial). Uma HQ nacional sob o selo RQT Comics, cuja história é tão cabeluda e tão crua, que parece até já ser uma lenda antiga e conhecida.
Sem dúvidas uma HQ bem diferente, com uma pegada suja, representação daquilo que é corrupto e decadente ponto final uma história em quadrinhos que reflete o underground, aquelas ruas que a gente evita entrar no mundo real. Na verdade sempre que falar de Roses N’ Guns, vou acabar voltando nisso; uma história real demais, ainda que se valha dos estereótipos famosos brasileiros, como o policial corrupto, a prostituição o mundo marginal… Uma HQ que sumariza o violento, a falta de nuance entre tantos absurdos.
Um camaleão temático
Aliás, aqui preciso destacar a versatilidade da escrita e imaginação de Gabriel Arrais; um verdadeiro camaleão temático! Do faroeste ao mundo musical, e do musical ao infantil, do infantil ao rolê mais Quentin Tarantiniano possível, Gabriel consegue abrir portais para outros universos, totalmente distintos e desconectados, com a maior facilidade. É como se fosse um Savant, nato das histórias em quadrinhos. Nesta produção ele entrega algo totalmente diferente daquilo que já havia trazido em outras histórias. Algo mais pesado, sinistro e real. Nos traços de Ossostortos esse mundo sujo e decadente cria vida.
Vingança, impunidade, sangue.
A história, o ponto de ignição de Roses N’ Guns, chega a ser absurdo e cômico, quando em contraste com tudo o que vemos nesses quadrinhos! O roubo de uma arma importante, no meio de um programa, da prostituição, de um PM jovem numa tentativa de carteirada. Uma ação tola e juvenil de um policial recém-formado que sabe que pode acabar com sua reputação na corporação. É dessa arma, desse erro e das histórias conectadas a esta arma que os “espinhos” das rosas começam a surgir. Uma ação que causa um rebuliço, um levante de vinganças e vendetas.
Como um relógio!
A passagem de tempo é muito bem marcada em RN’G, a partir de até um traço diferente, mais desbotado do artista Ossostortos. Até por ser uma memória, tudo fica meio embaçado, demarcando os limites entre memória e presente. Aliás, se tem uma coisa boa que este HQ faz, é não lhe deixar perdido ou descontextualizado. Na pintura do conto, acabamos entrando em diversas vidas e vidas diversas – discutindo o limiar da ilegalidade, da prostituição e da marginalização de travestis e mulheres de programa. Temas sempre difíceis, sobretudo pela facilidade de cair na desumanização através da violência, ou mesmo do desprezo, pelo preconceito de serem mesmo essas figuras marginais. As HQs, aliás, são famosas por reforçar estereótipos. Se valer de traços e trejeitos e também do imaginário coletivo para justificar estes estereótipos…
… Mas em Roses N’ Guns isso tudo é subvertido ao primeiro conhecermos apenas o lado marginal e violento, e posteriormente humano, negado, vulnerável. Mesmo dentro dessa pegada sombria e violenta, conseguimos reconhecer a rede de apoio, a humanidade ali presente, apesar da vida desumanizada que levam. Rede de apoio aliás, que rapidamente movimenta e transforma o último ato da HQ! Mas aqui vou lhes poupar desse spoiler.
Vidas e Rosas
É através de diversas histórias interligadas, entre jovens que entram no mundo do crime, os policiais corruptos e sempre presentes no da ilegalidade, as travestis, garotas de programa e suas vidas em meio ao mundo marginal, e também entre crenças que Roses N’ Guns acontece. A movimentação da HQ até assusta pelo timing que se desenvolve, quase como a de um relógio, das diversas histórias que se intercalam sem que sequer percebamos! Tudo vai acontecendo em blocos com muitas pessoas e histórias… Mas até o último momento, não sabemos exatamente como se juntam. Literalmente entre rosas e uma arma, tudo acontece de repente, como num disparo, um tiro à queima-roupa.
Roses N’ Guns – Entre becos, vidas e Rosas
Sempre achei que, pela criação violenta de país que temos, regado em impunidade, obrigando vários a vida marginal, há um fascínio pelo violento, pelo sanguinário… pela crueza do suburbano, e da várzea onde a violência é mais cruel. Roses N’ Guns me transmite esse sentimento, das histórias que acontecem mas não são narradas. das vidas que começam, vivem, e são interrompidas na calada da noite, num beco esquecido, sujo, prostituído.
Uma história real demais, com personagens reais demais, que acontecem no mundo real demais, apesar de ser uma HQ. Roses N’ Guns me deixou chocado, com uma história que parece ter sido vista e vivida, onde coincidências acontecem e definem o rumo de vida e morte de várias rosas. É tudo o que eu não esperava! Se tiver estômago para a violência, vale demais a leitura!
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