Dahmer: Um Canibal Americano é a mais nova série sobre o assassino em série Jeffrey Dahmer, que chegou à Netflix. Na tentativa de subverter e mostrar o lado das pessoas afetadas pelos seus terríveis atos, o seriado acaba fazendo mais do mesmo: uma glamorização do terrível, que conversa com a curiosidade mórbida das produções de True Crime.
Dahmer: Um Canibal Americano é uma produção original da Netflix, dirigida por Ryan Murphy e Ian Brennan, que se baseia em fatos, sobre um dos mais infames casos de assassinatos em série dos Estados Unidos. Trata-se do caso Jeffrey Dahmer, responsável por assassinar diversos membros da comunidade Gay e negra, nos anos 80. No casting temos Evan Peters (Jeffrey Dahmer), Niecy Nash (Glenda Cleveland) , Molly Ringwald (Shari Dahmer), Michael Learned (Catherine Dahmer) e Richard Jenkins (Lionel Dahmer), contendo 10 episódios totais. A produção busca mostrar – mais uma vez – os terríveis atos cometidos pelo assassino em série norte-americano Jeffrey Dahmer, que assassinou brutalmente 17 jovens, e ainda canibalizou algumas das vítimas.
Veja a sinopse:
“A série criada por Ryan Murphy analisa os crimes terríveis cometidos por Jeffrey Dahmer e os problemas sistêmicos que permitiram que um dos maiores serial killers dos Estados Unidos continuasse agindo com total impunidade ao longo de mais de uma década.”
A primeira impressão que temos é que Dahmer: Um Canibal Americano realmente busca quebrar o paradigma das produções sobre assassinos em série. Que realmente teremos uma produção que não quer transformar Jeffrey numa espécie de ‘mártir’, nem um ser complexo – e por ser complexo, interessante e excitante de acompanhar. Não, de primeira, vemos a produção problematizar os constantes privilégios brancos de Dahmer – em meio aos Estados Unidos das décadas de 80/90, onde as populações minoritárias tinham ainda menos expressão, voz e vez. Vemos também Dahmer ser descrito e roteirizado como um sujeito vazio, inexpressivo, raso…
Série da Netflix sobre o serial killer Jeffrey Dahmer recriou o momento onde Rita Isbell, irmã de uma das vítimas do canibal, confronta o mesmo no tribunal.
A semelhança e a atuação da atriz com o caso original é de arrepiar! 🤯 pic.twitter.com/g4w4RZrfke
— POPTime (@siteptbr) September 22, 2022
… Acontece que ao passo que a série progride, vemos estas anotações – dos privilégios do assassino, do descaso policial, da injustiça velada e do silenciamento das populações minoritárias – vítimas de Dahmer – se tornando cada vez mais escassas, e se não escassas, cada vez menos sobre as vítimas e seus sofrimentos, e mais sobre Jeffrey e seu benefício, suas escapadas da justiça. Como bois para o abate, vemos cada uma de suas vítimas vindo e indo, algumas histórias mais bem contatadas, outras que nem sentimos. Ouso dizer que, verdadeiramente, Dahmer: Um Canibal Americano só tem uma verdadeira preocupação com a vítima em um único caso – que é de Tony Hughes (Rodne Burford), caso tocante da vítima deficiente auditiva que tinha o sonho de ser modelo de revista, e era amável com a sua família e amigos.
Vemos o nascimento de Tony, acompanhamos as suas dificuldades e assistimos os caminhos que acabaram levando-o à Jeffrey. Aqui vemos um perfeito episódio – totalmente focado em Tony, sua vida, seus anseios – com a edição nos colocando até em sua própria perspectiva, zerando completamente o áudio, mostrando sua relação com as pessoas -Uma verdadeira aula de produção… Que dura este episódio. Logo em seguida, voltamos à rotina de mortes rápidas e terríveis, perspectiva de Dahmer, e sua chacina escorada em todos seus privilégios. Uma pena, porque claramente o caminho apresentado com Tony Hughes poderia ter sido a verdadeira história contada em Dahmer: Um Canibal Americano: Uma história sobre aqueles que não puderam contar as suas histórias.
Dahmer: Um Canibal Americano e mais uma glamorização do terrível
Na tentativa de fazer algo diferente, que fuja aos padrões do True Crime, da glorificação do assassino, da ode ao terrível, a série acaba exercendo exatamente a mesma função – com o adicional de trazer, acidentalmente ou não, as reações daqueles que sobreviveram ou sofreram na mão do assassino em série. Dahmer mira em contar a história dos que tiveram suas vozes silenciadas para sempre, mas acaba acertando em uma produção polida, bem feita, bem atuada e editada, mas que repete a terrível fórmula de tornar o assassino num sujeito interessante, curioso e até simbólico. Dahmer: Um Canibal Americano é mais uma produção que se perde em meio a tantas outras, que glamorizam o terrível.
Adorei a crítica. Cirúrgica!
Muito obrigado!! 🖤🖤