Os fãs de horror estão sendo presenteados ultimamente com produções nacionais do gênero, que têm desafiado obstáculos e preconceitos por parte dos que não curtem filmes brasileiros. Então vem conhecer essa pérola do terror BR! Vem conhecer As Boas Maneiras!
Como outras produções nacionais de gênero lançadas ultimamente, As boas maneiras primeiramente repercutiu internacionalmente, com o título Good Manners. Após uma repercussão, eles estreiam no circuito comercial aqui no Brasil, a depender de como eles foram recebidos. No caso desse filme de 2018 dirigido por Juliana Rojas e Marco Dutra, a recepção não poderia ser melhor! O filme aborda a licantropia (traduzindo: temática envolvendo lobisomens), e vemos a obra beber muito da fonte dessa lenda, porém focando mais na abordagem de acordo com nosso folclore.
A trama acompanha Clara (Isabel Zuaa), uma batalhadora moradora da periferia de São Paulo que é contratada como enfermeira de Ana (Marjorie Estiano), jovem que está esperando seu primeiro filho e vive sozinha em seu apartamento de luxo. As duas se tornam muito ligadas ao ponto de iniciarem um relacionamento amoroso. Porém, as coisas vão ficando estranhas à medida que Ana muda seu comportamento drasticamente, indo além dos sintomas de uma gravidez “normal”, apresentando reações desumanas. E a presença da criança garante que muita coisa ainda está por vir, afetando as duas personagens e a relação entre elas.
Fonte da imagem: IMDb
Você pode estar pensando que o filme tem lá suas limitações técnicas, e isso de fato é evidente no uso de CGI em algumas cenas, mas apenas isso, pois os efeitos práticos são um espetáculo! A direção é muito bem acertada, visto que os diretores combinaram na medida certa os elementos fantasia e realidade. Como assim? Eu explico: esse não é o tipo de filme que torna-se repentinamente bizarro, uma vez que já vamos tendo pistas de que há algo muito errado envolvendo o sobrenatural.
E ainda que seja uma obra que bebe muito da fonte do horror (inclusive ingerindo um ou outro clichê em determinadas cenas), As boas maneiras não se preocupa em assustar o espectador, visto que o terror é uma espécie de gênero secundário cuja presença é evidenciada a partir do momento que a fantasia ganha destaque, mas ainda assim a lenda urbana do Lobisomem não serve meramente para meter medo, e sim para contribuir para o que a trama propõe, mesclando o realismo com elementos do folclore brasileiro, algo presente nos relatos da personagem da Marjorie Estiano, por exemplo.
Fonte da imagem: IMDb
Trata-se de um filme feito para plateias mais maduras, visto que possui alguns detalhes que podem não atrair muito o público jovem, a começar pela duração, com mais de 2h00, num ritmo bastante lento! Porém, em momento algum, ele se torna cansativo, ao menos para quem entra na vibe de As boas maneiras, pois a abordagem da licantropia no filme não é convencional conforme as regras de Hollywood, fazendo com que alguns fãs de filmes com lobisomens possam torcer o nariz para essa obra. Particularmente, a partir da metade do filme, ocorreu-me um estranhamento após uma repentina passagem de tempo, num momento em que o filme parecia que ia parar por ali, de acordo com
os arcos das personagens. Porém, ainda não acabou! Apesar disso, conseguimos esquecer essa mudança de ritmo repentina da trama quando vamos criando empatia pelos personagens.
os arcos das personagens. Porém, ainda não acabou! Apesar disso, conseguimos esquecer essa mudança de ritmo repentina da trama quando vamos criando empatia pelos personagens.
Fonte da imagem: Revista Veja
E por falar neles, é bom mencionar que todo o elenco aqui faz um trabalho magistral, sobretudo a Isabel Zuaa, que transmite para o espectador diversas sensações. É só botar o olho nela que já nos identificamos com sua personagem, que mesmo se apresentando muito quieta e observadora, diz tudo com um olhar e poucas palavras, esboçando naturalidade. A Marjorie Estiano, mais conhecida pelos seus trabalhos da Rede Globo (me lembro bem de sua personagem na temporada de 2004 da Malhação – aquela da Vagabanda), também não fica muito atrás, com um
comportamento que se opõe ao da outra personagem. Sua Ana é uma mulher que lida de forma espontânea com a insegurança, se permitindo falar o que pensa, e viver uma rotina isolada mas produtiva ao seu modo. Falar sobre mais personagens seria um baita spoiler, então vamos parar por aqui.
comportamento que se opõe ao da outra personagem. Sua Ana é uma mulher que lida de forma espontânea com a insegurança, se permitindo falar o que pensa, e viver uma rotina isolada mas produtiva ao seu modo. Falar sobre mais personagens seria um baita spoiler, então vamos parar por aqui.
Como eu disse, o filme tem um probleminha no que diz respeito ao seu ritmo. Não que ele seja entediante, muito pelo contrário, porém as mudanças que ocorrem a partir da metade do filme não deixam de causar estranhamento, nem tanto pelo rumo que a história tomou, mas sim pela inesperada “pressa”, em um filme que estava se desenvolvendo lentamente de forma satisfatória. E quanto ao CGI, nem esquenta com isso! O fato de ser um efeito perceptível aqui não é muito diferente de outras obras do gênero horror, que mostram suas criaturas ao invés de esconder as limitações investindo no suspense. Ainda temos a construção do mistério e do suspense, mas aplicado ao que o filme propõe, ou seja, procurando não assustar, mas sim deixar o espectador intrigado. O filme também não possui jumpscares, e a trilha sonora é um tanto tímida, e o filme nem precisa tanto desse recurso, pois já expliquei qual o seu objetivo. Quando rola um susto (que são pouquíssimos) não temos aquele aumento repentino da música tensa, ou som de explosão.
Fonte da imagem: IMDb
Considerações finais
As boas maneiras é um filme imperdível, sendo aquele filme que você provavelmente não sabia que queria ver (pelo menos, foi o meu caso antes de assisti-lo no cinema). Se você espera um filme convencional de lobisomens, sugiro que abra um pouco a sua mente e esteja atento às referências ao folclore brasileiro. Arrisco dizer que esse filme é original em abordar esse tema dessa maneira, o que torna ele um filme essencial para todos, inclusive os brasileiros que possuem preconceito com produções nacionais.