Anora está entre os maiores dos Oscars 2025. Um filme excitante, vibrante, traumatizante e cheio de absurdos. Mas absurdos cômicos, que nos desafiam: até onde você aceita? Até onde você permite o absurdo ser cômico?
Por Joegrafia – Negro. Comunicador e Radialista. Editor, roteirista e fundador do NerdSpeaking. 🎙
Anora é mais uma das aclamações internacionais em 2025. Um filme absurdo e fantástico – mesmo que preso a uma realidade não tão distante de nosso mundo. Uma comédia/drama, dirigida por Sean Baker (The Florida Project, 2017) e atuada por Mikey Madison (Anora/Ani), Mark Eydelshteyn (Ivan Zakharov) e Yura Borisov (Igor). Um trio que carrega o filme nas costas, com atuações tão distintas entre momentos do filme, que parecem mesmo recortes de outras produções.
Anora conta a história de uma stripper imigrante do Uzbequistão, chamada Ani. Por saber falar um pouco de russo, Ani é chamada por seu chefe para servir um viajante, chamado Ivan (Vanya), filho de um oligarca poderoso, que está de passagem por Nova York, onde Ani trabalha. Ela vê nele uma possibilidade de ter uma vida menos cansativa, degradante. Uma vida possível, para além da margem. Ele vê nela uma oportunidade de não precisar voltar ao seu país, casando-se e permanecendo nos Estados Unidos. Um romance do absurdo se forma. Ani não sabia que aquilo seria o começo do fim.
Pensei que ia gostar mais do que gostei. Apesar de ser uma história tão carregada de drama, há uma constante condução para o humor, como se desafiasse o público a ver até onde enxergamos o cômico na linha tênue com o absurdo e abusivo. Tudo isso é genial, mas se perde um tanto quando a comédia se faz por quase toda a extensão do filme sem exatamente um fio condutor forte (que retorna apenas no último terço). Talvez, se o filme não fosse tão caótico, fosse mais sentida a necessidade de uma intervenção. Talvez ficasse mais claro que tudo que Ani passara eram abusos e sequestros.
Mas se precisássemos de um aviso para isso, seria o próprio absurdo. Ainda assim, é cansativo acompanhar Ivan e Anora, rumando por um humor que beira o American Pie, permitido numa sessão da tarde, misturado com trapalhadas que não levam a lugar algum, senão a outros absurdos surreais demais para se juntarem no tecido daquilo que há de mais realista dentro do filme: abusos e silêncios.
Anora – até onde você aceita?
Meu sentimento é de que o drama chega tarde demais, num filme que superestimula, para depois desacelerar bruscamente e tratar o que nunca foi tratado ao longo das duas horas. No fim, a bagagem de cada um que assistir Anora será essencial para enxergar o filme como uma comédia do absurdo ou um drama trágico dirigido como comédia. Mas, sem dúvida alguma, Anora deixa um murro na boca do estômago, enquanto nos pergunta até onde aceitamos os abusos e absurdos travestidos de humor.
Spoiler: aceitamos muito. Mas é comum.